quinta-feira, 22 de novembro de 2007

GENTES DO NORTE E O ALENTEJO

Li de relanço, como é meu costume, mas ficou-me aqui a zumbir no ouvido, para acabar com a zoeira nada melhor que depurar o assunto. Alguém escreveu qualquer coisa como “as gentes do Norte vieram cá matar a fome e agora esqueceram o Alentejo”, foi mais ou menos isto, não foi? Permito-me discordar, por mim falo e por muitos outros nortenhos seguramente. Recordo com saudade os tempos pós 25 de Abril de 1974, o tempo da tomada de posse das terras aos latifundiários, das cooperativas agrícolas do Povo “Em todo o país uma febre de mudança envolveu largos sectores da população que ambicionavam melhorar as condições de vida e de trabalho. Nesta conjuntura, destaca-se o investimento colectivo por parte dos trabalhadores agrícolas do sul de Portugal no processo de ocupação de terras e nas explorações colectivas. Uma acção colectiva de tal envergadura parece ser indicador suficiente do potencial dos trabalhadores agrícolas alentejanos para promover movimentos organizados em torno de objectivos bem definidos. O Alentejo cumpriria, assim, a sua vocação revolucionária” (Organização dos trabalhadores agrícolas na reforma agrária: O caso de Baleizão, de Margarida Fernandes) Eu só tinha ido ao Alentejo uma vez, a Évora, num passeio da quarta classe, e porque o professor era de lá, todas as outras turmas fizeram a trivial volta ao Minho. Desse passeio recordo o calor abrasador e um pormenor que registei numa praceta de Abrantes e nunca mais esqueci, as árvores que decoravam o largo eram laranjeiras, ou tangerineiras, e estavam carregadinhas, logo nessa ocasião pensei que se fosse no Porto, numa noite era feita a apanha total. Passemos adiante… A seguir ao 25 de Abril de l974, altura em que a maioria do Povo, tal como eu, começou a ter consciência que a política existia, que era para ser falada, discutida, entendida, tive a felicidade de descobrir que muitos dos meus conhecidos, mais velhos, eu à data tinha 21 anos acabadinhos de fazer, a um ano de casar pela primeira vez, se interessavam por essa coisa nova, mais, muitos deles haviam sido já detidos ou incomodados pela pide/dgs. Estavam quase todos ligados a movimentos ou associações, tais como a JOC, a LOC, o CNE, o Circulo Católico Operários do Porto, e alguns centros sociais paroquiais, alguns eram mesmo comunistas, até ali na clandestinidade. Em qualquer canto e esquina se improvisava um comício, eu adorava ouvir tudo o que eles diziam. Comecei a fazer como todos os jovens normais da época, colar cartazes, ir às manifs, eu sei lá, era uma roda viva. Voltando ao Alentejo, recordo-me perfeitamente de se fazerem colectas e comprarem-se numa casa que havia na Rua de S. João sacholas, pás, e outros utensílios em ferro, os cabos eram comprados num torneiro na Travessa da Ponte, faziam-se rondas de casa em casa a pedir roupa, angariava-se dinheiro, e tudo se levava ao Alentejo. Assim foi durante alguns anos até terem desbaratado a reforma agrária. Recordo-me que de duas vezes que fui com o pessoal do PC do Grupo de Trabalho de Mouzinho da Silveira, fiquei em casa de um enfermeiro em Portel e ele trabalhava na Vidigueira, era natural de Coimbra, ele e a mulher, mas tinha-se apaixonado pelo Alentejo e por lá ficou. O Alentejo apaixona, o seu silêncio, a sua paisagem, os seus monumentos, a sua comida, as suas gentes… Mas como em todo lado há as ovelhas negras como aquele Ricardo J.P. que tenta humilhar os nortenhos dando uma no cravo, outra no dedo do ferrador… Diz ele “supremacia Nórdica revisitada”, e continua “olhávamos para estes pobres seres humanos sujos que tinham hábitos de higiene medievais e que comiam em caldeiros comuns de couve e farinha onde todos mergulhavam a colher e comiam sem pratos”, para logo a seguir afirmar “mas isso não nos impediu de sermos amigos, irmãos, do mesmo sangue”. Com amigos e irmãos destes, quem precisa de inimigos? Eu prescindo atédo familiar. Quanto ao abraço aos Galegos, é natural que assim seja, tal como eles têm mais afinidades com os nortenhos portugueses que com os madrilenos, nós temos mais com eles que com os alentejanos. Eu não conheço, nunca ouvi ninguém dizer mal ou que não gosta do Alentejo, ouço isso sim muitas anedotas sobre alentejanos, mas se o seu azedume com os nortenhos é por pensar que elas são inventadas aqui em cima, está muito enganado, pois talvez todas elas tenham sido adaptação de anedotas inventadas no Brasil sobre os Portugueses. Não sei se o Ricardo J.P. é frequentador deste espaço (fórum Desabafe Connosco do JN), pelo sim pelo não, vou tomar a liberdade de lhe enviar este meu texto por e-mail, porque gostaria que me esclarecesse. Por exemplo, que podemos fazer nos mais pelo Alentejo? Já é destino de muitos daqui para a caça e férias, que mais podemos fazer? Diga… Com os galegos nós sabemos, eles estão aqui ao lado, as relações comerciais estão em franca expansão, mas aí, têm fábricas? Têm muitos produtos agrícolas para vender e não conseguem? É isso? Explique-se senhor. Sabe o que eu penso? Que o senhor teve uma má experiência aqui em cima, ou aí em baixo com alguém daqui de cima, não foi? Às tantas está apaixonado por alguém de cá que não quis ir praí e fugiu prá Galiza… Malandreco… Mas o senhor vai-nos esclarecer, não vai? Então até à sua resposta, saúde.

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